Tuesday, July 1, 2008

Porreiro, pá!

Com o chumbo dos irlandeses ao Tratado de Lisboa, a recusa dos presidentes polacos e checos em assinar o mesmo tratado e as reservas do presidente alemão, que resolveu pedir a constitucionalidade do tratado ao Tribunal Constitucional, o castelo de cartas construído pela dupla Sócrates/Barroso ameaça ir irremediavelmente por água abaixo. Recordo que Sócrates decidiu só legalizar a interrupção voluntária da gravidez após novo referendo. No fundo, respeitou a vontade popular que alguns anos antes tinha dito não. No caso do tratado constitucional, o caminho seguido foi incomprensivelmente o oposto. A manobra de transformar o tratado constitucional num tratado em quase tudo idêntico para ser aprovado pelos parlamentos nacionais, à margem da vontade popular expressa directamente por referendo, que antes se manifestara desfavoravelmente na França e na Holanda, foi, por isso, lamentável. A democracia não se constrói passando atestados de menoridade aos cidadãos. É verdade que muitas vezes a discussão sobre as questões europeias está inquinada por questões nacionais, mas a consciência dessa dificuldade deveria levar os políticos europeus a apostarem em mais transparência e clareza para poderem explicar claramente às pessoas o que está em jogo. O caminho seguido foi precisamente o oposto, com a redacção de um tratado incompreensível para a generalidade dos cidadãos, incluindo os próprios dirigentes políticos e afastando a sua aprovação da esfera dos cidadãos, deixando a tarefa a cargos dos directórios partidários, que contam com a submissa disciplina de voto partidária nos seus parlamentos. A chico-espertice não costuma dar bons resultados e o Tratado de Lisboa promete ter, por isso, o destino que merece. A União Europeia não pode ser construída à margem dos cidadãos, tem de ser construída com a sua participação directa. Os cidadãos não são estultos, sabem decidir bem se as questões lhes forem colocadas de forma clara, objectiva e transparente.